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O Quando das inutilidades Prioritárias

  • Dario de Melo
  • 14 de dez. de 2019
  • 4 min de leitura

O Quando das inutilidades Prioritárias

Quando a grande e única a preocupação dos nossos governantes parece ser as crianças que têm aulas debaixo das árvores, como se explica que ainda haja sala sem carteiras nem quadro, alunos sem bata?

Quando a diabolização do banco gentio e da lata de leite que foram as carteiras de emergência servem para justificar o insucesso escolar...

Quando alguém constrói uma escola de vinte lugares para crianças mais ou menos distantes umas das outras, e se esquece que os alunos têm de se deslocar sapatilhados pelo esforço das pernas...

Quando se fazem escolas não para servir os alunos, mas para servir o discurso que faremos quando S. Exª as vier inaugurar...

Quando essas escolas antipedagógicas e milionárias (feitas para mais de mil alunos) necessitam de 40 ou mais Professores que não têm alojamento, a menos que se construa um hotel ao lado de cada escola; ou se dividam das ou três salas para os professores habitarem...

Quando nos damos ao luxo de comprar autocarros para fazerem o transporte de alunos e professores, sabendo que um autocarro custa quase tanto como uma escola e que o dito autocarro precisa de um condutor, precisa de combustível, precisa de um controlo responsável, entre muitas outras coisas de que precisa...

Buco Mazi (Cabinda) tem uma escola. Fui o seu primeiro professor e, ao fim de 60 anos, pode não ter alunos, mas ainda está funcional.

E os autocarros (se os houvesse naquele tempo) onde estariam?

Quando sabemos que, na escola, toda a gente manda, embora ninguém faça coisa nenhuma – desde o delegado escolar que está na capital da província ao inspector que aparece quando aparece, ao director da escola, ao subdirector pedagógico, ao responsável pela disciplina A, B ou C, escolhidos por critérios de interesse político-partidário...

Quando todos mandam e ninguém é responsável, a culpa é d professor (que faz o que pode) ou dos chefes (que nem fazem, nem talvez possam fazer)?

O que é o professor, no meio disto tudo? Uma espécie de papel higiénico de que todos necessitam, e se deita fora, depois da serventia acabada.

O Quando da Desculpa Universal

Quando dirigentes que só conhecem o povo dos “vivas” nos comícios e saídas do ventre materno do Partido aprenderam que a desculpa, se não resolve, adia, e, adiando, acaba por se fazer esquecer...

E que desculpa é essa? Para uns não temos condições, para outros não temos sistema, e para os demais não temos verba.

E o que são condições?

Infelizmente, alguns dirigentes parecem pensar que basta construir uma escola, enchê-la com carteiras e quadros para ficarem com os problemas do ensino resolvidos.

Porém, não são as escolas que ensinam a ler; nem as carteiras que fazem as crianças escreverem bem e sem erros; nem com professores à boleia que dão uma hora de aulas por dia, porque têm de chegar a tempo à faculdade, onde também são estudantes; nem com inspectores, tipo polícias caça-multas que não ajudam os professores a serem melhores; nem com discursos, bons propósitos, e um canudo sem experiencia que se ensinam alunos.

Quem ensina a ler (em 2/3 meses) são os métodos que os professores desconhecem.

Estamos a ensinar segundo a Cartilha de João de Barros, do séc XVI e nela afirmava que “uma das coisas que causam mais espanto nestes reinos é que um sapateiro que é o mais reles dos mestres mecânicos precisa prestar provas para ser oficial na sua arte, e o mestre da Escola nada lhes seja exigidos” ...

Veja como as coisas ainda são e como os séculos não desgastaram esta verdade...

Foi esta cartilha que o rei de Portugal enviou à Rainha Jinga, porque, embora tivesse nos padres secretários que lhe liam as cartas dos governadores e do rei e secretários nativos com que conferia os dizeres das palavras que lhe enviavam, como boa política, só confiava nela própria.

O Quando dos pobres

Quando temos petróleo, diamantes, talco, ferro, ouro e outros tantos minerais, podemos dar-nos ao luxo de distribuir gratuitamente às nossas crianças os livros escolares; e não só!

Quando sabemos que a Suécia, a Noruega, a Dinamarca, a Inglaterra e outros países, mares do bom bacalhau, mas que estão na vanguarda pedagógica entre os melhores do mundo, e como são pobrezinhos, em vez de dar livros aos alunos, distribuem-se à Escola.

Nestas Escolas dos pobrezinhos, o professor ensina a cuidar dos livros para que sirvam a outros alunos em futuros anos. A escola recebe 20% dos livros necessários para substituir os eventualmente menos cuidados.

E como és professor, controlas os estragos que os alunos fazem nas nossas casas sem condições? Controla, porque os livros ficam na escola...

E quando é que eles estudam?

Não estudam.

Acabam-se com os alunos carregados de livros, acabam-se com inúteis trabalhos de casa, a exemplo dos países pobrezinhos de que falei (o último foi a Espanha).

E assim sendo, não caímos na idiotice de ter crianças na “pré” com trabalhos de casa e explicador.

Nestas escolas milionárias das terras onde ainda há fome, os meninos podem rasgar, pintar, escrever nos livros, porque p´ro ano há mais.

Contas que qualquer kinguila faz: gastamos num ano o que deveríamos ter ensinado a poupar, para servir em cinco.

Senhor secretário de Estado, quando nos custará ser ricos (estragando um ou dois milhões de livros por ano) se formos pobrezinhos e poupados?...

(Publicado no "Novo Jornal" 29.09.19)


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